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Mangaká da Favela

Atualizado: há 14 horas

As primeiras impressões e análise de contexto de um mangá impactante ambientado no Brasil.

Arte de Minoru Taruro.
Arte de Minoru Taruro.

Hiroto Takei é um mangaká (autor de mangá) com 30 anos de idade, que se sente fracassado em sua escolha profissional. Está há anos tentando emplacar uma série, e tudo o que conseguiu em vinte anos de tentativas foram três histórias soltas publicadas, o que não preenche nem mesmo um único volume encadernado. Seu editor o convida a tentar ser professor de mangá, pois possui bom conhecimento técnico, mas ele prefere se afastar de tudo.


Decidido a mudar de vida, ele sente que precisa pensar com calma, e resolve viajar para o lugar mais distante possível do Japão, do outro lado do mundo. Ou seja, o Brasil, um país do qual conhece quase nada, apesar de ter aprendido português por causa de um interesse amoroso (que terminou em frustração, como tudo em sua vida).


Ele vai para São Paulo, capital, em busca de novos ares. Tentando ir para a famosa Avenida Paulista, se perde de um modo tão desastrado que acaba indo parar em uma comunidade dominada pelo crime organizado.


Sua chegada não poderia ser pior, testemunhando um assassinato e sendo assaltado. Mas nem tudo é azar nessa chegada, e ele acaba conhecendo um adolescente chamado João, que chama sua atenção ao ser visto desenhando em estilo mangá, no meio de um depósito de lixo. Assim, Hiroto vai conhecendo a dura realidade de uma comunidade, um nome socialmente mais aceitável para o que antes era chamado de favela.

João: entre a arte e a violência, ou entre o sonho e a realidade.
João: entre a arte e a violência, ou entre o sonho e a realidade.

Ajudado por João, Hiroto acaba indo conhecer a família do garoto, e vai tendo contato com a dura realidade econômica em uma comunidade. João vive com a mãe, Isabela, o irmão mais velho Gab e a irmã mais nova, Mia. João trabalha e estuda, mas seu irmão integra a perigosa facção criminosa conhecida como I.M., que domina o tráfico de drogas no Estado de São Paulo. Normalmente pacífica, a comunidade vive um clima de guerra, pois a facção criminosa que domina o Rio de Janeiro, a FSL, quebrou um acordo de anos e resolveu expandir seus domínios para as comunidades paulistas. Com isso, um clima de medo se instalou no local, com tiroteios e assassinatos frequentes.


Em meio a tudo isso, João se vê pressionado a seguir a sina de sua família e entrar para a I.M., como mais um assassino e traficante de drogas. Hiroto, ao saber disso, se desespera e resolve fazer de tudo para ajudar João a participar de um concurso para novos autores no Japão, e tentar assim uma vida melhor como mangaká. Tendo desistido de seu sonho, Hiroto vê em João alguém com potencial para alcançar seus próprios sonhos... Isso se a dura realidade permitir.


O primeiro capítulo da obra estreou na plataforma Ichijin Plus, da editora Kodansha. De maneira emblemática, isso aconteceu no dia 18 de junho, que no Brasil é comemorado como o Dia da Imigração Japonesa. Os primeiros cinco capítulos foram compilados em um volume, lançado simultaneamente no Japão e no Brasil em abril de 2025. Foi um feito inédito, visto que o normal é que a obra venha para cá com bastante atraso (às vezes, de até muitos anos).


A obra foi baseada em extensa pesquisa feita pelos autores, com uma colaboração na coleta de informações de vários brasileiros. O desenho de Minoru Taruro tem um bom design de personagens, conferindo emoção e personalidade a cada um que é apresentado. A ambientação também é boa, mas o desenho é um tanto irregular. Isso fica claro na página dupla que mostra São Paulo, com um desenho que aparenta ser mais um rascunho do que uma arte finalizada. Um defeito menor, pois a narrativa é poderosa e cria uma leitura muito envolvente, valorizando ainda mais o bom roteiro de Sohachi Hagimoto.

Através de Isabela, Hiroto tem contato com uma realidade difícil, que o deixa preocupado.
Através de Isabela, Hiroto tem contato com uma realidade difícil, que o deixa preocupado.

Em termos de enredo, a motivação dos personagens soa genuína e o drama é muito bem conduzido. Com relação ao contexto em que acontece a ação, deve-se lembrar que é uma obra de ficção, e carrega nas tintas ao retratar a violência. [Nota: Este que vos escreve já lecionou desenho em uma comunidade em São Paulo durante dois anos e nunca ouviu um único tiro por lá.]


Pode-se fazer a ressalva de que o enredo mostra que há uma incomum guerra de facções em andamento, com os similares fictícios dos verdadeiros grupos que dominam o crime organizado em São Paulo e no Rio de Janeiro. Ainda assim, a reação das pessoas perante tiroteios e assassinatos à luz do dia dá a impressão ao leitor de que os autores podem ver as comunidades quase como zonas de guerra, o que nem de longe expressa a verdade. Porém, nunca se deve esquecer que é uma obra dramática de ficção, então que ninguém espere ver um documentário em quadrinhos. Aspectos do cotidiano e caracterizações de personagens, que são fundamentais, foram executados de maneira bastante crível e fidedigna.


A obra também cai no clichê político de mostrar logo de cara policiais corruptos, mostrando a influência de uma cultura midiática orientada ideologicamente. É uma mentalidade comum nos meios intelectuais e culturais, que tanto glamuriza a pobreza das comunidades quanto demoniza a figura do policial, sendo que a realidade traz tons um tanto mais acinzentados e com ramificações diversas. Mas o veredito final do primeiro volume é altamente positivo. Outro ponto a se destacar são as interessantes análises que Hiroto faz do trabalho de João, podendo fornecer dicas e inspiração a autores iniciantes que lerem a obra. Violenta, dramática e emocionante, Mangaká da Favela é uma obra promissora, que mal começou no Japão e que pode evoluir ainda mais, sendo séria candidata a ganhar adaptação em animê futuramente. Apesar de alguns clichês e visões equivocadas comuns a estrangeiros, o saldo final é bastante positivo e é um entretenimento de qualidade, feito com muito respeito pelo Brasil.


MANGAKÁ DA FAVELA Título original: Favera no Mangaka ~ ファヴェーラの漫画家

Roteiro: Sohachi Hagimoto

Arte: Minoru Taruro

Produção editorial: Mythos Editora Tradução: Luana Tucci

Formato: 13,7 x 20cm, com 210 páginas Total: 2 volumes lançados no Japão (série em andamento) Estreia no Japão: junho de 2024 (web)

Lançamento no Brasil (impresso): Panini ~ Planet Mangá (abril de 2025)

Classificação indicativa: 14 anos


::: E X T R A :::


  • Uma adaptação em vídeo do primeiro capítulo de Mangaká da Favela, dentro do projeto Mangá Dublado:


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