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Ale Nagado

Cells at Work! BABY

Questões sobre o início da vida em uma obra que aborda a Ciência e a Medicina com humor, drama e aventura.

Spin-off de um inesperado sucesso do mangá.

Cells at Work! é o título internacional do animê e mangá Hataraku Saibou, uma série de premissa bastante diferenciada. Nela, as histórias se passam dentro de um corpo humano, apresentado simbolicamente como um grande complexo residencial e industrial, com as células sendo retratadas de forma humanizada. Glóbulos brancos, vermelhos, plaquetas, linfócitos e demais componentes do sangue e sistema imunológico são mostrados como trabalhadores de um grande complexo industrial. Todos têm suas funções e trabalham duro para que o organismo se mantenha bem.


As histórias giram em torno do trabalho interminável de se manter um organismo vivo e saudável, com cargas sendo transportadas pelas células ou invasões de bactérias e vírus sendo enfrentadas por anticorpos em batalhas sangrentas. Com histórias simples e dinâmicas, conceitos ligados à medicina e à biologia vão sendo apresentados de modo didático, mas sem perder de vista o quesito entretenimento.


O mangá original, criado por Akane Shimizu, estreou em março de 2015 na revista mensal Shonen Sirius (Ed. Kodansha) e rendeu seis volumes compilando suas histórias. No Brasil, a série original Cells at Work! faz parte do catálogo da Panini Comics (lançamento oficial: agosto de 2022).


Seu sucesso acabou gerando outros mangás derivados, um romance no formato light novel, uma peça de teatro e uma série em animê lançada em 2018, composta por 13 episódios e mais um especial. Essa obra, produzida pelo estúdio David Production, foi transmitida para o Brasil via Crunchyroll, oficialmente e com legendas em 2018, simultaneamente à exibição no Japão.


Com a boa aceitação, foi lançada uma segunda temporada em 2020, e o universo da série continuou a crescer. Em 2019, estreou na revista mensal para jovens adultos Morning (Ed. Kodansha), uma nova obra derivada: Cells at Work! BABY.

A abertura colorida da primeira história de Cells at Work! BABY, na revista Morning

Com texto e arte de Yasuhiro Fukuda, a nova história em quadrinhos mostra o desenvolvimento de um bebê, ainda no ventre de sua mãe, a partir da primeira semana de gestação. Novos personagens são acrescentados e todos ganharam um tratamento mais infantilizado e fofinho. Mas nem tudo é diversão, pois o tema desse mangá tem um potencial explosivo em termos de debate público. Ao mostrar um feto como um ser vivo independente, a obra traz à tona a questão do aborto em um país onde ele é bastante permitido.

Uma questão polêmica e sempre atual:


No Japão, o aborto é realizado sob diversas alegações (incluindo problemas financeiros) até 12 semanas, graças às leis aprovadas após o final da Segunda Guerra Mundial, sob ocupação americana. Um dos objetivos, especulam alguns pesquisadores, era diminuir a população japonesa para reduzir os riscos do país se tornar novamente uma potência militar e ameaça futura. No século XIX, porém, era considerado crime praticar o ato.


Conforme o caso, é permitida a intervenção abortiva até 22 semanas de gravidez, mas existem clínicas clandestinas que praticam o ato em qualquer tempo de gestação. Estima-se que cerca de 250 mil abortos sejam feitos no Japão anualmente (levantamento anterior a 2019), um número assustador.

A simpática arte de Yasuhiro Fukuda.

Como o preservativo não é bem aceito entre os japoneses (e nem a pílula anticoncepcional), é comum a gravidez na adolescência, interrompida em clínicas de aborto clandestinas. Um efeito colateral disso é que os casos de HIV crescem no Japão desde os anos 1990, conforme já atestou a entidade local AAA (Act Against AIDS).

Nem os planos de saúde e nem o governo custeiam o aborto, o que fez a prática se tornar um grande negócio para muitos médicos e clínicas especializadas. Porém, mesmo com tal permissividade vista na sociedade, as maiores religiões do país, o Xintoísmo e o Budismo, condenam o aborto (mas não realizam mobilizações contrárias) e existem até rituais e imagens para representar as almas dos bebês mortos no ventre de suas mães. Até um movimento religioso japonês como a Seicho-No-Iê, presente no Brasil, realiza orações e cultos pelas almas de bebês abortados. Nesse aspecto, há uma convergência das crenças e seitas locais com o cristianismo, que ocupa um discreto terceiro lugar entre as religiões existentes no Japão. Mas, a grande verdade é que o povo japonês em geral é mais supersticioso do que religioso, havendo uma camada expressiva da população que não possui qualquer sentimento sobre o transcendental.


A terceira maior religião presente no Japão, o Catolicismo, tem presença tímida no país, com uma longa e trágica trajetória em solo nipônico. Única força religiosa internacional a tradicionalmente atuar na conscientização contra o aborto, o cristianismo no Japão não tem poder de influência algum.

Anúncio da segunda temporada da obra original.

Ao mostrar de forma intensa e simpática como funciona o desenvolvimento de um ser humano desde sua primeira semana, Cells at Work! BABY acaba reforçando o debate sobre o aborto, evidenciando um dado científico apontado pelos que combatem a prática: A de que o feto é um organismo vivo, um ser humano desde sua concepção, e não são ideologias políticas ou convicções pessoais que decidem o valor de uma vida ou estabelecem quando ela começa a ser merecedora de proteção. O próprio título, ao chamar o feto de "bebê", já evidencia uma posição clara em todo esse debate. Com índices de natalidade em um nível baixíssimo, o aborto é um tema crucial no Japão, mas que ninguém tem coragem de abordar, de tão normalizado que foi na sociedade. Em todo esse contexto social, o alcance de uma série voltada ao público jovem pode ser pequeno, mas trabalha importantes conceitos de maneira lúdica e didática, entrando no imaginário popular. Dentro de um panorama abrangente da chamada guerra cultural em que vive mergulhado o mundo do entretenimento, não deixa de ser um respiro pró-Vida a proposta desse mangá.


A franquia Cells at Work!, que ignora completamente a politização da cultura pop no ocidente, tem outros spin-offs que merecem destaque, como Cells at Work! LADY (sobre a biologia feminina), Cells at Work! Code Black (sobre o que acontece com as células de uma pessoa de vida desregrada) e Cells at Work! Illegal (sobre a fisiologia de um usuário de drogas), entre outros títulos. Code Black, inclusive, também ganhou versão em animê.


Cells at Work! é mais uma prova de que obras de cultura pop podem ser usadas para ensinar fatos científicos e, sutilmente, passar mensagens fortes para seu público, sem cair no mero discurso panfletário.


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