Um jornal em busca de audiência e a arte de opinar sobre o que não se conhece.
O site jornalístico Estado de Minas publicou, no último dia 6 de fevereiro (mas só vi bem depois), uma reportagem alertando sobre os perigos da animação japonesa. Se ainda não leu, convido a primeiro ler para depois acompanhar
Conforme apontado na matéria, foi citado um estudo americano sobre os danos que assistir TV demais causa ao desenvolvimento cerebral. Isso está bastante documentado, e é extensivo ao uso de computadores, celulares e afins. A questão é real, séria e objeto de profundas preocupações com relação às gerações cada vez mais expostas a artefatos eletrônicos.
É aí que entra o neurocientista brasileiro Fabiano Abreu, pós-doutor em sua área de atuação. Segundo ele, animês são ainda mais nocivos que outras atrações da TV, pelo "claro apelo emotivo de tramas bastante fortes e de cunho sexual para crianças, trilhas sonoras, efeitos visuais, pobreza de vocabulário e atitudes dos personagens que estimulam a violência e solidão, contribuem para isso”.
Novamente, um amontoado de generalizações, algumas causadas pelo fato de que produções criadas para adolescentes no Japão acabam sendo vistas por crianças no Brasil devido a uma falta de preocupação com classificação etária. Mas aí, precisa explicar pela milésima vez que nem todo desenho animado é feito para crianças, e que há um abismo de diferenças entre Pokémon e Attack On Titan.
Afinal, porque a implicância com o animê? Simples, é por causa da imensa popularidade. Criticar de modo sensacionalista algo que tem milhões de fãs vai atrair muita gente para ver seu conteúdo, desde pais preocupados até fãs indignados. Sensacionalismo é um recurso um tanto pobre, mas condizente com o conteúdo apresentado.
Nem vale muito à pena discorrer sobre cada erro apontado pelo pesquisador, que possui uma visão bastante superficial sobre o vasto universo da animação japonesa.
Chama a atenção ele mencionar "pobreza de vocabulário". Por acaso um desenho infanto-juvenil tem que usar linguagem erudita ou são as dublagens que buscam (naturalmente) uma linguagem coloquial? Esse senhor nunca viu alguma série qualquer na TV? Pobreza de vocabulário é um "defeito" tipicamente notado em produções japonesas?
O cientista brasileiro comenta durante a matéria sobre a "pobreza de expressões" nos animês, o que nas crianças impediria o desenvolvimento da cognição com base no reconhecimento de expressões de pessoas reais.
Eu perguntaria o que esse cidadão entende sobre desenho e a estilização necessária para animações. É certo que o uso demasiado de telas em tenra idade inibe nas crianças o pleno desenvolvimento de suas funções cognitivas, além do aprendizado sobre as próprias emoções e sua capacidade de socialização. É algo geral, motivo de real preocupação para pais e educadores. Novamente, não é algo que é exacerbado com o animê. Esse senhor já viu as animações americanas que as crianças assistem? Finalmente, tem a questão do "emburrecimento" que o animê supostamente promove.
De acordo com variadas fontes de referência, o QI médio no Japão, a terra dos emburrecedores desenhos que a matéria menciona, é de 104,5, enquanto no Brasil a média do QI populacional é de 85. A culpa deve ser dos animês, claro, na cabeça de pessoas desinformadas que precisam de sensacionalismo para se promover.
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