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Representatividade Amarela

Algumas reflexões sobre um emergente movimento racial e social.

Imagem: Dreamtime
Imagem: Dreamtime

Eis um assunto que me incomoda um pouco, e que é muito delicado. Tenho visto em redes sociais aqui e ali um movimento emergente de "identitarismo amarelo". Descendentes de orientais falando em "vozes amarelas", "representatividade amarela", e coisas do tipo. Seguindo os passos do movimento negro, buscam visibilidade e espaço no mercado cultural, leia-se: TV, cinema, editoras, agências de publicidade e afins.


Já se disse, no passado, que há muito preconceito contra a presença de asiáticos em novelas ou na grande mídia, o que não deixa de ser meio óbvio, mas já foi muito pior. Oriental (em geral, "japonês", que é como sou chamado até hoje por muitos) já foi sinônimo de gente invisível, irrelevante do ponto de vista estético para o brasileiro médio em décadas passadas. A explosão da cultura pop japonesa entre o final dos anos 1980 e em especial nos anos 90, bem como a Onda Coreana (que começou timidamente ainda nos anos 90), eliminaram essa percepção e a beleza oriental caiu no gosto médio da população. O K-pop e os K-dramas mudaram paradigmas de beleza em todo o Ocidente, e isso inclui o Brasil. E no geral, a percepção do brasileiro sobre orientais e seus descendentes é bem positiva há muitas décadas.


Claro que estão tentando incentivar a presença de descendentes de asiáticos na mídia, pois isso é trabalho e dinheiro no bolso de quem estiver bem posicionado junto ao movimento. E para chamar a atenção, uma dose de vitimismo acaba sendo usada.


Basicamente, eu discordo de abordagens meramente identitárias, que ficam categorizando e classificando as pessoas por cor de pele, sexo, raça ou o que for, pois isso já tem motivado leis das mais controversas em nosso país.


Somos todos seres humanos e filhos de Deus, e é nisso que eu acredito. Também acredito em oportunidades iguais, mas com resultados proporcionais a serem conquistados por mérito, não por uma compensação histórica ou uma imposição de qualquer tipo.


Kimonos tradicionais da China, Coréia e Japão.
Kimonos tradicionais da China, Coréia e Japão.

Para quem está de fora vendo esse movimento, pode parecer uma atitude de sobrevivência mercadológica, pois muitos já perceberam que a cultura em nível governamental tem suas preferências quando se fala em diversidade. Eu não acho saudável para uma sociedade ficar classificando as pessoas por grupos identitários, o que é uma visão política e ideológica. Acredito que a arte e a cultura já estão politizadas demais. Para muita gente, tudo gira em torno de identitarismo e valorização de raça, cor ou gênero, o que é algo divisionista típico da cultura Woke. Porém, em diferentes momentos da História, movimentos identitários foram importantes para chamar a atenção da sociedade e lutar contra situações profundamente erradas e injustas. Não vejo essa gravidade sobre descendentes de japoneses, chineses e coreanos no Brasil atual.


O descendente de asiático pode até se queixar de estereótipos e piadas, mas não dizer que são socialmente oprimidos. Ignorados por alguns segmentos culturais, certamente são, mas o mangá, animê, dorama, K-pop, K-drama, cinema chinês, japonês e coreano... tudo isso virou mainstream, fora a culinária, muito apreciada. Na real, a queixa é que os brasileiros com ascendência asiática muitas vezes não conseguem espaço em editais culturais do governo para falar de cultura asiática, que privilegiam muito mais outras manifestações culturais ligadas à raça. E isso é muito mais uma luta política por espaços nos meios culturais e midiáticos.


É certo que muitos dos primeiros imigrantes japoneses, no começo do século passado, foram enganados para virem ao Brasil. Muitos trabalharam em condições difíceis e hostis, quase análogas à escravidão. Durante o período da Segunda Guerra Mundial, os japoneses e descendentes foram realmente oprimidos pelo governo brasileiro, sendo proibidos de falar em japonês em público. Muitos tiveram casas invadidas por policiais e soldados, em busca de "indícios de atividade inimiga", e sofreram humilhações severas. Acho importantíssimo contar essas histórias, e há obras que fazem isso com maestria. Mas contar essas histórias é algo muito diferente de levantar bandeiras identitárias.


Tem um outro ponto: não dá para colocar num mesmo balaio japoneses, coreanos, chineses, filipinos, tailandeses, indianos ou vietnamitas. Culturas milenares com pontos de intersecção e influências mútuas, mas diferentes entre si. E por mais que eu seja conhecido por divulgar a cultura pop japonesa, ou mesmo a cultura japonesa em geral, também gosto e lido com outros assuntos, como o quadrinho brasileiro e o mercado editorial. Eu jamais me deixaria encapsular em um movimento identitário, pois minha identidade como nipo-descendente é apenas um aspecto do que eu sou, não a totalidade do meu ser e meus interesses.


Se a pessoa, descendente ou não, gosta ou se identifica com a cultura japonesa, que divulgue essa cultura. Se é descendente ou prefere a cultura coreana, divulgue a cultura coreana, e por aí vai. As culturas asiáticas, especialmente a coreana e a japonesa, têm conquistado muitos entusiastas sem qualquer ascendência. Ao se falar em "identidade ou representatividade amarela", pode-se cair em algum tipo de exclusivismo ou superioridade de alguém falar sobre um assunto com base em raça, em ancestralidade. Conheço não-descendentes que conhecem e fazem muito mais por culturas asiáticas do que muitos descendentes.


Cada povo asiático tem suas peculiaridades, assim como acredito que cada nação africana tenha a sua própria história, arte, culinária, biotipo médio e costumes. Basicamente, o identitarismo se forma a partir da necessidade de uma categoria social oprimida, e não vejo assim a situação de asiáticos e seus descendentes no Brasil. Cor de pele ou um conceito de raça é algo que cria rótulos, algo tão nocivo quanto estereótipos, mas eu não sou sociólogo ou antropólogo, então peço desculpas por colocações imprecisas. O aspecto principal deste breve artigo é marcar uma posição sobre esse tema. Enfatizar herança genética para ressaltar seu "lugar de fala" em assuntos culturais é algo nocivo, pois conhecimento sobre uma cultura pode ser adquirido com convivência e estudo.


Enfim, vejo com certa preocupação o crescimento desse movimento pela "representatividade amarela". Pode parecer apenas uma legítima luta por espaço nos mercados de trabalho artísticos e culturais, mas o componente político que isso carrega é potencialmente gerador de mais divisão, vitimismo e ressentimentos. Nossa sociedade já está dividida demais.



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