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80 anos do pesadelo nuclear

Fatos históricos e considerações sobre Hiroshima e Nagasaki.

Hiroshima em agosto de 1945.
Hiroshima em agosto de 1945.

Em 2025, o Japão relembra os 80 anos dos bombardeios nucleares nas cidades de Hiroshima e Nagasaki, ocorridos em 6 e 9 de agosto, respectivamente. Sempre que o assunto vem à tona, acontecem discussões sobre a necessidade ou não daqueles ataques brutais.


Antes de prosseguir, deixemos claro que a intenção aqui não é defender a posição do Japão na Segunda Guerra Mundial ou tratá-lo como mera vítima de um conflito que, afinal, ajudou a iniciar.


País com histórico de invasões e agressões contra nações asiáticas, o Japão formou o Eixo ao se aliar ao nazismo da Alemanha e ao fascismo da Itália. Transformado em uma "nação de samurais" graças à instrumentalização do Bushidô, o código de honra dos samurais, para inspirar lealdade absoluta no povo, o Japão ainda clamava pela origem divina de seu Imperador, que era reverenciado como um deus.


O Japão cometeu atrocidades inimagináveis em suas guerras, incluindo massacres de civis, estupros coletivos e hediondas experiências "cientificas" com cobaias humanas, conforme relatos sobre a temida Unidade 731. Mas uma coisa não justifica outra, e civis são sempre os inocentes sacrificados em qualquer guerra. Hiroshima foi destruída em 6 de agosto de 1945, com uma bomba nuclear de urânio, que causou a morte de mais de 90 mil pessoas. Três dias depois, em 9 de agosto, foi a vez de Nagasaki, dizimada com uma bomba nuclear de plutônio, que exterminou mais de 70 mil pessoas. Os números são imprecisos e controversos, pois incontáveis pessoas morreram vítimas de envenenamento radioativo e doenças provocadas pela radiação ao longo dos anos.

Uma construção que resistiu em Hiroshima, preservada até hoje.
Uma construção que resistiu em Hiroshima, preservada até hoje.

Entre tantos criadores de conteúdo que já abordaram o assunto, sempre aparece gente para explicar o contexto na visão dos EUA, seja defendendo ou relativizando a decisão acerca dos ataques nucleares a civis. Um específico que vi recentemente, falou sobre a participação do Japão na guerra, defendendo a tese de que o ataque nuclear impediu mais mortes, e disse que não comentaria sobre a escolha dos alvos. Mas a escolha dos alvos foi pensada e isso é muito relevante para se entender os acontecimentos. Era preciso que as cidades alvo tivessem grande densidade populacional, para estudar os efeitos da radiação sobre diferentes tipos de pessoas e faixas etárias. Isso é amplamente conhecido.


Hiroshima é cercada por vales que iriam reter a radiação localmente, permitindo um estudo detalhado sobre seus efeitos nas pessoas e no meio ambiente. Nisso, o Governo Americano pensou nas pessoas como ratos de laboratório. O motivo da escolha já foi contado até mesmo dentro do Museu Memorial da Paz, em Hiroshima. A cidade também possuía uma academia militar, e isso para muitos justificava sua destruição, pois tinha seu valor estratégico.

Nagasaki destruída por uma bomba nuclear.
Nagasaki destruída por uma bomba nuclear.

Há também o fato de que cada cidade foi vítima de um tipo diferente de bomba nuclear, sendo palcos perfeitos para os testes. Havia toda uma intenção clara de aproveitar a guerra para fazer um experimento com populações civis estrangeiras e "justificar" os pesados investimentos no desenvolvimento de bombas atômicas. Nagasaki não tem uma explicação oficial para sua escolha além da densidade populacional, e há quem diga que foi ao acaso, devido às condições do tempo desfavoráveis em outros alvos inicialmente planejados. Mas lá era o centro do catolicismo japonês, estabelecido lá desde o século XV e havia resistido a sangrentas perseguições.


A derrota do Japão era iminente e o governo de ocupação que seria imposto ao país derrotado levaria o Liberalismo aos japoneses. Dentro desse plano, eliminar o Cristianismo (essencialmente contrário a ideologias) na região seria útil politicamente, ainda mais se levarmos em conta que o presidente dos EUA à época era Franklin Roosevelt, um destacado membro da sociedade secreta Maçonaria, inimiga histórica da Igreja Católica. Finalmente, em 15 de agosto de 1945, o Japão anunciou sua rendição, pondo fim à Segunda Guerra Mundial. O próprio Imperador Hirohito (1901~1989) leu uma mensagem transmitida pelo rádio a todo o povo japonês, pedindo que aceitassem pacificamente o desfecho da guerra. A ocupação por forças americanas começou em 28 de agosto e o tratado de rendição foi oficialmente assinado em 2 de setembro de 1945, a bordo do navio USS Missouri. E uma nova era se iniciou.

A assinatura da rendição do Japão, a bordo do navio USS MIssouri.
A assinatura da rendição do Japão, a bordo do navio USS MIssouri.

O gabinete de ocupação, liderado pelo General Douglas MacArthur, organizaria uma nova estrutura política, econômica e social baseada no pensamento liberal, que já tinha seus adeptos no Japão. Enquanto isso, um gabinete paralelo trabalhava secretamente em conjunto com mafiosos japoneses para reprimir movimentos estudantis rebeldes, mas principalmente os tradicionalistas e os comunistas, os dois extremos que poderiam se opor à nova ordem liberal. Tendo renunciado a seu poder como governante e também à sua condição divina, o Imperador Hirohito jamais foi julgado pelos crimes de guerra de seu país, o que acabou acontecendo com altos oficiais militares. Chamado postumamente de Imperador Showa (o nome de seu período de reinado, entre 1926 e 1989), ele foi deixado livre para ser um símbolo de unidade nacional, mantendo o foco do povo na reconstrução do país e no sentimento de buscar a paz. A resiliência que se seguiu à derrota se tornaria um símbolo de bravura de toda uma nação.


O Japão se tornaria historicamente submisso à diplomacia americana e sempre foi visto como um importante território a ser defendido dentro da geopolítica asiática, por sua proximidade com a China e a Rússia, à época ainda como União Soviética.


Dentre os argumentos dos que defendem os ataques americanos, o mais usado é o de que isso evitou mais mortes, acelerando o fim da guerra. O argumento cai por terra com a constatação de que o lançamento das bombas seguiu um roteiro planejado para otimizar o "experimento". Porém, o Japão anunciava que lutaria até o fim, e que cada japonês estaria disposto a morrer por seu país. Havia realmente esse temor de que o Imperador preferisse o suicídio de todo o povo a uma rendição incondicional. E também é fato que os termos de rendição do país já eram discutidos internamente, de modo a tentar preservar o máximo possível de sua integridade política, institucional e territorial. Ainda assim, não são raras as pessoas que dizem que o Japão mereceu as bombas atômicas, por causa do ataque à base de Pearl Harbour em 1942. Falta de senso de proporções, infelizmente, é um problema crônico na cabeça de muita gente.

Hiroshima, como o resto do Japão, foi reconstruída e atingiu grande prosperidade.
Hiroshima, como o resto do Japão, foi reconstruída e atingiu grande prosperidade.

Com as bombas, a rendição foi incondicional e abriu espaço para a ocupação liderada pelos americanos, que indiscutivelmente levaram o Japão a uma nova era. Veio mais progresso tecnológico, recuperação estrutural, prosperidade econômica e o país se tornou também uma potência cultural, como todos sabemos.


Que o Japão e o Eixo precisavam ser detidos, isso é mais do que óbvio. A única questão que se coloca aqui é registrar que o massacre nuclear poderia ter sido evitado (e nisso o próprio Governo Japonês teve culpa também), e que os bombardeios nucleares foram atos de terror dos EUA, com objetivos frios e muito bem estabelecidos e calculados. E um deles era demonstrar ao mundo que possuía um poder devastador e que não deveria ser desafiado. Mas para muita gente, ávida em sempre exaltar os EUA, a explicação sobre "acelerar o fim da guerra" tem um ar de misericórdia divina. E para validar isso, muita informação relevante deve ser omitida.


Dentro da chamada Direita brasileira, é bastante comum o sentimento de devoção americanista, a ponto de se endeusar os EUA como a "polícia do mundo", os defensores da democracia e das liberdades individuais, evitando qualquer comentário negativo sobre a História do país. Tal sentimento é tão errado que o Americanismo já foi considerado uma heresia por setores da Igreja Católica. Não havia nada de humanitário e havia muito de friamente estratégico na escolha dos alvos e no timing dos acontecimentos. Além disso, os EUA se apresentaram ao novo mundo que se formava como a primeira grande e temida potência nuclear, o que levaria grande parte do mundo à Guerra Fria com o bloco comunista.


Cena do mangá Gen Pés Descalços, de Keiji Nakazawa.
Cena do mangá Gen Pés Descalços, de Keiji Nakazawa.

Ao longo do tempo, o pesadelo nuclear foi incorporado ao imaginário do povo japonês e inspirou muitas obras no campo cultural e de entretenimento, como o dramático mangá Gen Pés Descalços, sobre a dura vida após o pesadelo nuclear, ou franquia cinematográfica Godzilla, que surgiu misturando o trauma de guerra e o medo da radiação com ficção científica.


Passados 80 anos, é importante refletir sobre Hiroshima e Nagasaki como testemunhos da crueldade e estupidez da guerra, e que a vida de inocentes importa. Não que isso sensibilize os frios e poderosos senhores da guerra contemporâneos, que tratam territórios como tabuleiros e pessoas como peões em um jogo de poder, ideologias, ganância e morte. As lições do passado parece que nunca são aprendidas.


Vídeo recomendado:

  • Sinos da catedral de Nagasaki tocam pela primeira vez desde o bombardeio nuclear:


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