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SPECTREMAN

O guerreiro ecológico que lutava contra os monstros criados por um homem-macaco vindo do espaço.

Capa do single com o tema da série, lançado no Japão em 1971.

O impacto de Ultraman, Ultra Seven, Robô Gigante e outros super-heróis no Japão dos anos 1960 provocou um crescente interesse por seriados de ação e efeitos especiais. Isso desencadeou uma série de obras que, apesar de similares entre si, raramente conseguiam arranhar a popularidade dos heróis Ultra. Uma dessas produções, porém, feita no início da década de 1970, conseguiu não só rivalizar com os Ultras clássicos em seu país de origem, como também obteve sucesso nos Estados Unidos, França e Brasil.

A saga de Spectroman (nome original do herói) foi concebida por Souji Ushio (1921~2004), pseudônimo do autor de mangá, animador e produtor Tomio Sagisu, fundador do estúdio P-Production, o mesmo que produziu Lion Man e Vingadores do Espaço. Atualmente, o estúdio, cujo espólio já pertenceu à Tsuburaya Productions (de Ultraman), é administrado por Shiro Sagisu, filho mais velho de Souji Ushio. Desde sua origem, uma produtora diferenciada, com heróis dramáticos e humanos.


Filmado com recursos bem limitados, o seriado ajudou a criar no Japão uma verdadeira mania por monstros, revigorando o gênero. Um herói com sentimentos humanos, fraquezas e rebeldia, inimigos carismáticos e histórias criativas fizeram a fama de um dos mais famosos clones do Ultraman.


O enredo mostrava o guerreiro especial vivendo oculto na Terra a mando dos Dominantes, seres avançados do planetoide artificial Nebula 71, para alertar a humanidade sobre os riscos da destruição do meio ambiente. Disfarçado de humano e assumindo o nome Kenji, ele se juntou à Divisão de Pesquisa e Controle de Poluição, também chamada de Grupo Anti-poluição, uma equipe de pesquisadores ambientais. Liderados pelo Chefe Kurata, os agentes Kato, Ota, Wada e Minnie acolheram Kenji como o mais novo integrante da equipe.

Dr Gori vs Spectreman

A chegada de Spectreman coincidiu com o primeiro ataque do monstro venenoso Hidrax, enviado pelo Dr. Gori; um fugitivo do distante planeta Epsilon, um gênio científico dotado de um QI de 300. Gori é um simióide (homem-macaco) que almeja assumir o controle da humanidade, que considera algo abjeto e vulgar. Ao seu lado, seu assistente Karas, um homem-gorila tão forte e leal quanto burro.


Gori vê a humanidade como uma ameaça ao planeta, um sentimento sombrio que na verdade movimenta pessoas e entidades poderosas do mundo real, que colocam o ambientalismo acima de vidas humanas, custe o que custar. O vilão se especializaria em criar monstros que se alimentam de lixo e inicia sucessivos ataques contra o Japão, um país que naquele tempo (1971) sofria com a poluição desenfreada de suas indústrias, que demorariam para investir em filtros eficazes. O tema da poluição ambiental apareceria em obras como Gozilla vs Hedora, lançada no mesmo ano. Mas as missões de Spectreman estavam longe de serem apenas batalhas contra monstros selvagens. No episódio duplo "O Exílio de Spectreman" (eps. 5 e 6), o herói se recusa a matar uma família que estava contaminada com um vírus mortal criado em laboratório e que podia exterminar a humanidade. Como punição, é imobilizado pelos Dominantes e lançado em um planeta deserto, onde é atacado por seus inimigos, até que uma cura é descoberta. Essa aventura foi escrita por Kazuo Koike (1936~2019), o aclamado criador do mangá Lobo Solitário. Em outro arco duplo de histórias, Gori saiu de cena para o confronto de Spectreman com o vampiro espacial Vordalak (eps. 44 e 45), uma aventura antológica.

Tetsuo Narikawa como Kenji, o disfarce humano do herói.

Um momento dramático e cheio de questionamentos sobre a condição humana veio no arco duplo "O preço do gênio" (eps. 48 e 49), inspirado no romance de ficção científica "Flores Para Algernon", de Daniel Keyes. Nele, um homem de pouca inteligência é transformado artificialmente em um gênio da ciência, mas o processo o transforma em um ser horrendo. Alguns momentos do seriado traziam uma carga de violência e drama impensáveis para produções infantis atuais, como a Operação Genocídio, mostrada no arco "Assassinos do Além" (eps. 59 e 60), com mortes violentas em profusão e o heroico sacrifício de um garotinho sensitivo no final. Mas a carga de violência que a TV da época permitia já é mostrada logo no segundo episódio, com Karas matando humanos como se quebrasse bonecos, girando fatalmente a cabeça de um e fazendo a cabeça de outro afundar dentro do corpo com um golpe. Ao longo dos episódios, o Grupo Anti-Poluição deixou as pesquisas de lado e começou a usar armas avançadas para ajudar Spectreman, tornando-se o Grupo Anti-Monstros. Ficou uma imitação meio rústica de equipes estilo Esquadrão Ultra (de Ultra Seven) mas, sem dúvida, a mudança deixou os episódios mais movimentados. A partir do episódio 36, todos aqueles pesquisadores passaram a usar armas de raios e um arsenal que incluía um helicóptero armado com foguetes. Não havia explicação alguma, e ninguém ligava, obviamente.

A ameaça do monstro Giganthermis.

A conclusão da série foi carregada de drama, como não poderia deixar de ser. Kenji faz amizade com um jovem boxeador, mas ele é usado por Gori para criar um monstro cujos reflexos fossem capazes de impedir Spectreman de disparar seu Spectro-Flash. Com a derrota da criatura, Karas se oferece para um desafio final contra Spectreman. Tanto esforço empregado em sucessivas batalhas acaba cobrando seu preço e o herói exaure totalmente suas forças. Os momentos finais da série mostravam o herói partindo de volta para seu lar, depois de perder o poder de assumir forma humana, vencer Karas e presenciar o suicídio do Dr. Gori. Vendo-o partir, os membros do Grupo Anti-Monstros revelam que já haviam descoberto sua identidade secreta. E foi assim, de modo bem melancólico, que o programa terminou, com aquele senso de nobreza e drama que tanto caracterizava os super-heróis japoneses clássicos.

O VILÃO COMO ASTRO


Dividindo as atenções com o poderoso herói, a grande atração da série era sem dúvida o maligno Dr. Gori. Egocêntrico, histérico, megalomaníaco e cheio de tiques nervosos, o estiloso macaco loiro e seu fiel assistente Karas foram criados graças ao sucesso mundial do primeiro filme da franquia O Planeta dos Macacos, lançado em 1968, bem como de suas sequências, iniciadas já em 1970. Gori, apesar de ser o vilão, era o personagem-título da série, em uma jogada bastante ousada.


Assim, Uchuu Enjin Gori (ou "Homem-Macaco Espacial Gori") era uma obra bastante peculiar. Ao longo da exibição, o título da produção mudou para Uchuu Enjin Gori x Spectroman e, finalmente, apenas Spectroman na fase final. Porém, o tema da série sempre destacava o herói, não o vilão. (Confira na ficha técnica a numeração de cada fase)

Um dos muitos livros de referência sobre a série.

Tendo estreado com 8,35 de audiência, foi evoluindo e fechou com um pico de 20% de audiência, uma boa marca para a época. Na média, foi menos visto que o Kamen Rider original da Toei Company (que teve média de 21% e máxima de 30%) e O Regresso de Ultraman da Tsuburaya Pro (média de 22,7% e máxima de 29,5%), mas foi muito bem assim mesmo.

Considerando que o Rider era trabalho de um grande estúdio e o Ultraman Jack tinha uma produção muito mais cara e trabalhosa, a equipe da P-Productions conseguiu um ótimo resultado em termos de audiência. Sem o mesmo recurso de seus concorrentes, a equipe de Souji Ushio se concentrava muito nos roteiros, entregando histórias dramáticas que prendessem a atenção da audiência.

Além de Gori, os monstros eram outra grande marca do programa. Ao longo da série, apareceu uma barata gigante (eps. 7 e 8), um rato alado gigante e com duas cabeças (eps. 9 e 10), uma baleia cachalote voadora (eps. 17 e 18), um monstro com cabeça de semáforo (eps. 23 e 24) e muitas outras ameaças memoráveis. O herói teve uma versão em mangá com nove volumes assinada por Daiji Kazumine, que desenhou adaptações de Ultraman, Ultra Seven, Ultraman Leo, Inazuman, Lion Man, Fireman e muitos outros personagens televisivos.

Spectreman no traço de Daiji Kazumine. Edição nacional.

No elenco, brilhou o ator e lutador de karatê Tetsuo Narikawa (1944~2010), que depois faria participações em Kamen Rider, Lion Man, Ultraman Leo e muitas outras produções para TV. O diretor Kurata foi vivido por Toru Ohira (1929~2016), que antes havia interpretado o vilão Rodak (voz e traje) em Vingadores do Espaço. Célebre como dublador e locutor, foi o narrador em Goggle V, Jaspion, Spielvan, Jiraiya, Jiban e muitas outras séries.

Na equipe, além dos cinco homens, havia espaço para uma integrante feminina, mas foram quatro ao longo da série, sem que as substituições fossem explicadas. Era como se fossem estagiárias da equipe, que funcionava como uma organização não-governamental. As que ficaram mais tempo foram a modelo Sakurako Shin (Chieko) e a cantora Rie Asakura (Kimie), que adotou depois o pseudônimo Taeko Sakurai. Vestindo o traje do herói como suit actor, estava Koji Uenishi, que já havia feito o mesmo trabalho em Ultra Seven. E ele ainda pôde dar voz ao inimigo Karas, já que a voz do herói transformado era feita pelo próprio Tetsuo Narikawa.

A TRAJETÓRIA NOS EUA E BRASIL Nos Estados Unidos, levado pelo produtor Richard L. Rosenfeld, o nome do herói foi alterado de Spectroman para Spectreman e o seriado ganhou sua estilosa música-tema conhecida no ocidente. O tema americano de abertura é uma variação sobre a base instrumental da canção "The first day of forever", da Mystic Moods Orchestra, de 1973. Criação do americano Brad Miller com vários colaboradores ao longo do tempo, a banda manteve-se ativa entre 1966 e 1993. Já a melodia do tema original (confira no fim do post) foi mantida na trilha instrumental, especialmente em cenas de batalha. Foram feitos alguns cortes de cenas demasiado violentas para o público infantil ocidental, além de algumas mudanças de nomes. No Brasil, o herói estreou em 1981 na TV Record, onde era exibido semanalmente à noite e com uma hora de duração; o que funcionava bem, pois quase todos os episódios eram duplos. A série logo migrou para a TVS (que logo se tornaria o SBT), onde ganhou enorme popularidade na programação infantil, indo até meados de 1990. Infelizmente, nem todos os episódios passaram na emissora de Silvio Santos durante as exibições finais da série. A dublagem, feita nos estúdios da TVS, era recheada de vozes que ficariam mais conhecidas na dublagem de Chaves, como Marcelo Gastaldi (o Chaves) como o agente Wada, Carlos Seidl (Seu Madruga) como o Dr. Gori ou Osmiro Campos (Prof. Girafales) como Karas. Para o papel do herói, o excelente Luiz Nunes, que faria um grande trabalho ao ganhar pela primeira vez um papel de protagonista. Porém, a edição de áudio era péssima, parecendo que as vozes saíam de dentro de uma cabine.

Os quadrinhos nacionais, com a arte de Eduardo Vetillo.

Spectreman ganhou no Brasil uma versão em quadrinhos na Editora Bloch desenhada por Eduardo Vetillo, que teve um grande destaque como desenhista dos Trapalhões. Foram 30 edições em formatinho, lançadas entre 1983 e 1986. Com o nome do herói alterado de Kenji para Kenzo, traje do herói com design e cor diferentes do original, o gibi era uma produção "alternativa", nunca autorizada ou reclamada pela P-Production.


No ano do cinquentenário do herói, os fãs brasileiros foram brindados com o lançamento do mangá original. Em novembro de 2021, a editora Pipoca & Nanquim lançou o mangá desenhado por Daiji Kazumine (1935~2020), compilando a série em 4 volumes. Olhando em retrospecto, Gori podia ser definido como um eco-terrorista, enquanto Spectreman e seus amigos eram ecologistas, que defendiam o meio ambiente, o que inclui a harmonia do homem com a natureza. Cheia de momentos intensos e antológicos de uma época ingênua, Spectreman é uma produção cult como poucas. E, preparando o terreno para cada um de seus divertidos episódios, uma sóbria locução alertava os telespectadores, mais ou menos assim:

Planeta: Terra. Cidade: Tóquio. Como todas as metrópoles do planeta, Tóquio se acha hoje em desvantagem em sua luta contra o maior inimigo do homem, a poluição. E apesar dos esforços das autoridades de todo o mundo, pode acontecer o dia em que a terra, o ar e as águas venham a se tornar letais para toda e qualquer forma de vida. Quem poderá intervir? Spectreman man man!

Contra a baleia mecânica voadora.

::: FICHA TÉCNICA - SPECTREMAN :::

TÍTULOS ORIGINAIS - Uchuu Enjin Gori ("Homem-Macaco Espacial Gori" - Episódios de 1 a 20) - Uchuu Enjin Gori x Spectroman (Episódios de 21 a 39) - Spectroman (Episódios de 40 a 63) Estreia no Japão: 02/01/1971 (TV Fuji) Número de episódios: 63

Emissoras no Brasil: TV Record e TVS/ SBT Versão brasileira e dublagem: TVS (Estúdio Com-Arte) EQUIPE DE PRODUÇÃO Criação: Souji Ushio (a.k.a. Tomio Sagisu) Planejamento: Toru Matoba Roteiro: Masaki Tsuji, Keisuki Fujikawa, Kazuo Koike, Shouji Nemoto, Susumu Takaku e outros Trilha sonora: Kunio Miyauchi e Naohiko Terashima Efeitos especiais: Tooru Matoba, Nobuo Yajima, Takeo Sakai e Kouichi Ishiguro Direção: Keinosuke Tsuchiya, Kouichi Ishiguro e outros Produtores: Souji Ushio (P-Pro), Takaharu Bessho (TV Fuji) Realização: P-Production e TV Fuji ELENCO (Nota: Quando necessário, o nome original do personagem aparece entre parênteses.) Kenji (Jooji Gamou)/ Spectreman [voz]: Tetsuo Narikawa Chefe Kurata: Tohru Ohira Kato (Shinichi Kaga): Takamitsu Watanabe Takashi Ota: Kazuo Arai Wada (Toshio Arito): Koji Ozaki Minnie (Rie Endo): Machiko Konishi Chieko (Mineko Tachibana): Sakurako Shin Yumi (Midori Sawa): Rumi Goto Kimie (Hiromi Yanagida): Rie Asakura Spectreman [suit actor]: Koji Uenishi Dr. Gori [voz]: Kiyoshi Kobayashi (eps. 1~10, 19~29), Seizo Kato (eps. 11 ~ 18), Ren Nishiyama (eps. 30 ~ 63) Karas (Raa) [voz]: Koji Uenishi Voz dos Dominantes / Narrador: Kyoshi Kobayashi - Lista de dubladores brasileiros

::: E X T R A S :::


1) A abertura norte-americana, exibida no Brasil:


2) Abertura original da série, mostrada do capítulo 1 ao 39. O nome da série era de Gori, mas desde o começo a música falava do herói. "Spectroman Go Go" Letra: Yuuji Amemiya / Melodia: Kunio Miyauchi Intérpretes: Mizusu Jidôu Gashôudan (Coral Infantil Mizusu), Honey Knights, Studio Orchestra

- Confira a abertura neste link, pois o fã que postou não permite incorporação, somente visualização no YouTube.

3) Segunda abertura da série, que passou a se chamar "Uchuu Enjin Gori vs Spectroman".


4) A música que deu origem ao tema americano da série. Melodia inspirada e uma linha de baixo vibrante!

"The first day of forever "- Mystic Moods Orchestra


5) Episódio piloto ~ 1970

- Aqui, o episódio-piloto produzido em 1970, com cerca de 11 minutos de duração. Originalmente, Gori teria o visual que acabou ficando com Karas e não haveria um assistente na ponte de comando da espaçonave. Spectreman (que quase se chamou Element Man) tinha um visual muito diferente, com parte do rosto do suit actor Koji Uenishi à mostra. Além disso, a atmosfera era bastante sombria.


Produzido ao custo de 8 mil dólares, esse piloto também apresentou um ator diferente, cujo nome se perdeu no tempo. Os produtores inicialmente queriam o famoso modelo Jiro Dan (que acabou interpretando Hideki Goh em O Regresso de Ultraman), ou alguém com seu tipo físico. Jiro Dan sequer chegou a gravar qualquer teste, a despeito de boatos que correram entre fãs durante anos.

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